Giovanni ex alunoIfes 2Uma ideia que nasce dentro do ambiente escolar pode criar asas e um dia virar um negócio inovador e lucrativo. É com esse pensamento de ninho que estudantes são estimulados ao empreendedorismo nas instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, durante as atividades de ensino, pesquisa e extensão dos cursos técnicos de nível médio ou no ensino superior. E os resultados chegam ao mercado em forma de bijuterias feitas com ossos de peixe ou kits didáticos para aulas presenciais ou a distância, entre outros exemplos de produtos criados dentro de sala de aula, laboratórios ou incubadoras, por todo o Brasil.

Alunas dos cursos técnicos em Mineração e em Química do Campus Macapá do Instituto Federal do Amapá (Ifap), Amanda Nicole dos Santos, Anna Maria Barbosa, Luany Beatriz Amanajás, Paola Silva e Taina Isabelle Pereira, todas entre 16 e 17 anos, mal sabiam o que iriam fazer quando foram convidadas pela professora de Mineração Lídia Dely Meire a participar de uma pesquisa sobre ossos de peixe. “Quando eu estava no segundo ano do curso, tínhamos uma matéria chamada Meio Ambiente e um certo dia a professora me chamou para falar de um projeto para obtenção de um mineral a partir dos resíduos de ossos de peixe”, lembra Luany.

Uma a uma foi se juntando ao grupo que logo ganhou o nome de “Ifish”, numa combinação da sigla da instituição com a palavra peixe na língua inglesa. A propósito, o time também inclui a professora de Língua Espanhola Thaynam Santos, que projeta o futuro intercâmbio acadêmico e comercial com países latinos. Se depender das premiações, o trabalho tem horizonte promissor. Já ganhou o Desafio de Ideias no 12º Congresso Norte-Nordeste de Pesquisa e Inovação (Connepi), em 2018, e, mais recentemente, em outubro de 2019, o bronze na categoria Ensino Médio do Prêmio Sebrae de Educação Empreendedor.

Ifish Ifap 1Em dois anos, a prática levou as estudantes a experimentar não só a atividade científica, mas deu a elas o aprendizado necessário para a criação de produtos com aceitação no mercado – bijuterias, vasos e copos feitos com cerâmica resultante da transformação química dos ossos de peixe. O processo de fabricação começa com a coleta dos resíduos do pescado nas feiras livres de Macapá. Das ruas, o material vai para o laboratório do campus do Ifap, onde é limpo, lavado, secado, calcinado e moído, até a obtenção do mineral hidroxiapatita. Esse pó misturado a caulim e argila forma a barbotina, cerâmica líquida que é colocada em moldes de gesso que dão origem às peças.

A diretora de Pesquisa e Extensão do Campus Macapá, professora Leila Cristina Nunes Ribeiro, ressalta que o Ifish é uma das iniciativas voltadas a incentivar uma mentalidade empreendedora nos estudantes, que poderão, inclusive, apostar na criação de cooperativas. “Queremos desmitificar aquela ideia de que saindo daqui os alunos têm a obrigatoriedade entrar numa empresa, ter uma carteira de trabalho assinada. Hoje temos um grande quantitativo de desempregados no País. É muito interessante termos cada vez mais projetos como esse, porque demonstram que podemos vencer pela educação e podemos colher os louros da pesquisa”, afirmou.

Desenvolvimento de competências – Exemplos de políticas voltadas ao desenvolvimento de competências nos estudantes e nos servidores podem ser vistas também no Instituto Federal de Rondônia (IFRO), em que as Pró-Reitorias de Ensino, Pesquisa e Extensão atuam em conjunto com os campi, por meio de diversas ações, desde a inclusão da disciplina de Empreendedorismo em todos os cursos técnicos de nível médio até o permanente relacionamento institucional com a classe empresarial.

Para o reitor Uberlando Leite, a participação de servidores e alunos do IFRO em eventos voltados à inovação no mercado é resultado dos investimentos. Na Campus Party Brasil de 2017 e 2019, foram 80 participantes em cada. No ano passado, a Campus Party Rondônia teve nada menos que 600 representantes do instituto federal. Outro reflexo do incentivo a novas criações é a implantação de três incubadoras de empresas – nos campi Porto Velho Calama, Porto Velho Zona Norte e Ji-Paraná.

Ambientes de criatividade e capacitação – As incubadoras de empresas incorporam o que na natureza chamamos de ninho, quando se trata de gerar ideias de negócios, transformá-las em produtos ou serviços e levá-las ao mercado, não sem antes, ou durante, capacitar as pessoas envolvidas no processo. É assim que milhares de estudantes da Rede Federal têm se tornado empreendedores bem-sucedidos.

Levantamento parcial do Fórum de Pesquisa e Inovação (Forpog) do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) indica que pelo menos 20 instituições possuem incubadoras próprias – Institutos Federais do Acre (Ifac), do Amazonas (Ifam), do Ceará (IFCE), do Espírito Santo (Ifes), Goiano (IF Goiano), do Norte de Minas Gerais (IFNMG), do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), do Triângulo Mineiro (IFTM), de Mato Grosso (IFMT), de Mato Grosso do Sul (IFMS), do Pará (IFPA), da Paraíba (IFPB), do Sertão Pernambucano (IF Sertão-PE), Fluminense (IFF), do Rio Grande do Norte (IFRN), do Rio Grande do Sul (IFRS), Farroupilha (IFFar), de Rondônia (IFRO), de São Paulo (IFSP) e do Tocantins (IFTO). Nas demais, as incubadoras estão em implantação ou as instituições atuam em parceria com o parque tecnológico local.

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Foi dentro da incubadora do Campus Serra do Ifes que o mundo empresarial se abriu para o então estudante do curso Técnico em Mecânica, no Campus Vitória, Giovani de Oliveira Silva Junior. “Entrei na Intechno em abril de 2012, como estagiário, onde fiquei quatro anos e lá na incubadora a visão que eu tive de mercado foi muito bacana, porque, no ensino, você aprende a fazer tudo sozinho. E de repente quando me vi no mercado de trabalho eu falei ‘nossa agora eu tenho que fazer tudo em grupo’. E aquilo começou a abrir a minha mente, como aluno, dentro da incubadora. Não tive uma visão de um pequeno funcionário que faz uma pequena etapa em um setor numa empresa. Eu conheci uma empresa por inteiro, então aí me veio a motivação de empreender”, conta.

Hoje sócio da Intechno, fabricante e fornecedora de kits didáticos para grandes instituições de ensino em todas as regiões do Brasil, Giovani é responsável pelo desenvolvimento de novos produtos. “Agora estamos trabalhando com realidade virtual. Com o crescimento da Educação a Distância (EaD), os laboratórios estão se tornando virtuais, de acesso remoto. Estamos desenvolvendo kits didáticos para linhas de veículos híbridos, elétricos, kits para automação, controle, programação, enfim, preparando o profissional para a era digital. Mas nunca esquecendo que o profissional do futuro é aquele que vai ter as características intrinsecamente humanas. A máquina vem fazendo uma série de coisas, mas não vai conseguir fazer o que o ser humano tem que é ilógico”, explica.

“O que me fez me tornar sócio foi a visão de que a tecnologia vem, mas é preciso trazê-la para um ser humano. Porque é ele que vai trabalhar com isso, independentemente do quanto esteja avançada a tecnologia. A máquina não vai conseguir atingir esse sentimento que nós temos”, completa o ex-estagiário. “Comecei a minha carreira como aluno, fiz estágio numa incubadora do instituto e hoje sabe quem é meu cliente? O instituto federal. Tem nosso equipamento no Instituto Federal do Espírito Santo, Rio de Janeiro, Brasília, Goiás, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Mato Grosso do Sul”, completa.

Assim como nas demais instituições da Rede Federal, a incubadora do Ifes é um ambiente organizacional e educacional desenvolvido para oferecer residência temporária e suporte para empreendimentos inovadores. Lá dentro, empreendedores têm oportunidades de capacitação, uso e compartilhamento de infraestrutura física, serviços, laboratórios de pesquisa, mentoria e assessoria gerencial. Entre 2017 e 2018, mais de 200 projetos entraram no que se chama “pré-incubação” – fase na qual são preparados para se tornar empresas. Seis empreendimentos foram incubados e quatro já foram graduados como empresas. E assim também, nas dezenas de “ninhos” espalhados pelo Brasil afora, muitos negócios promissores são preparados para levantar voo.

 

Suely Leitão

Jornalista do Instituto Federal do Amapá (Ifap)

Fotos: Divulgação Rede Federal

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