O dia 8 de março é conhecido por ser um marco mundial no que diz respeito à luta feminina pela garantia de direitos. É uma data histórica que eclodiu das reivindicações das mulheres por melhores condições de trabalho e participação em espaços políticos e sociais.
Como, então, falar sobre essa data sem refletir sobre a presença das mulheres em espaços de poder? Não tem como não fazer essa ligação. Assim como nas vivências diárias, são inúmeras as barreiras que existem na trajetória delas. E isso dificulta a chegada ao destino final.
Além da sobrecarga relacionada ao trabalho, afazeres domésticos, cuidado com os filhos - quando têm -, essas mulheres ainda precisam construir, a longo prazo, uma base para conquistar um “lugar elevado no pódio”.
Um exemplo nítido dessa dificuldade de chegar a um espaço de poder é representado no Congresso Nacional: dos 513 deputados e deputadas federais, 91 são mulheres, enquanto no Senado há apenas 15 lideranças femininas - e esses números representam a maior quantidade de mulheres que o parlamento já teve na história. Na Esplanada dos Ministérios, há um cenário semelhante: no começo do atual governo, foram escolhidas apenas 11 mulheres para liderar ministérios, também um recorde. Já no Poder Judiciário, há apenas uma ministra no Supremo Tribunal Federal (STF).
E foi justamente nessa direção que a deputada federal Dandara Tonantzin (PT/MG) trouxe à tona o assunto ao seminário “Liderança Feminina e a Ocupação nos Espaços de Poder”, organizado pelo Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) na última terça-feira (5/3), durante a 131ª Reunião Ordinária do colegiado, em Brasília.
“Há 92 anos as mulheres conquistaram o direito ao voto. E só somos 18% do total de pessoas eleitas em 2022. Na Câmara, somos [um pouco mais de] 17%. E esse é o recorde no parlamento. Somos só 16% das vereadoras e 13% prefeitas. Agora, fazendo o recorte de mulheres negras, somos apenas 4% de pessoas eleitas para cargos de representação no nosso país. Não dá para acharmos que é algo natural”, disse Dandara ao plenário do Conif.
“Mulheres lideranças, como nós, não surgem do nada. São construídas e fortalecidas. Tenho certeza que todas as mulheres reitoras aqui presentes têm uma história para contar. Se não tiver na base, na ponta, um processo de construção, a gente não vai conseguir alterar a composição desses espaços de poder. Vamos investir em mulheres para assumir papéis estratégicos, para ser nossas reitoras e pró-reitoras. A gente não brinca de fazer gestão, a gente se entrega de corpo, alma e coração. A gente constrói pontes”, completou a parlamentar, direcionando o foco para a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
Desafios
A equipe de Comunicação do Conif aproveitou a data para realizar uma entrevista exclusiva com a professora Joaquina Nobre, reitora do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG).
Joaquina está entre as 14 reitoras que lideram as instituições da Rede Federal. Um dos marcos de sua gestão é a implementação do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e Sexualidade (NEPGES) no IFNMG.
Questionada sobre as dificuldades enfrentadas pelas mulheres para conquistar cargos de poder, Joaquina lembra que a sobrecarga da tripla jornada - trabalho, afazeres domésticos e, em muitos casos, cuidado com os filhos - está entre as principais.
“Na perspectiva humana, temos que aprender que a força dos braços das mulheres não está à disposição para a existência confortável dos homens. E, quando falo da força do braço da mulher, é no sentido do trabalho, porque essa mulher vai ter muita dificuldade para permanecer em espaços de poder, uma vez que a maternidade vem com um peso romântico em cima dela, os afazeres de casa, o cuidado, alimentação e saúde da família, a educação dos filhos e filhas. É um trabalho muito grande que fica sobre a mulher. Como essa mulher estará num espaço de poder se é a força do braço dela que gerencia toda a família?”, indaga.
Assim como Dandara, Joaquina lembra de outro ponto importante: para chegar ao cargo almejado, é necessário construir uma base e dar as condições necessárias às mulheres.
“Os homens sempre tiveram uma rede de apoio. Quando ele quer estar nesse espaço de poder, tem uma mãe que prepara a alimentação, que separa suas roupas e sapatos, que marca uma consulta, que o ouve e acolhe. Depois, se ele contrai um matrimônio, vem outra mulher com toda dimensão do cuidado. É necessário, então, criar condições para que essas mulheres consigam exercer seu papel enquanto liderança. E como garantir? A formação é um caminho. É preciso olhar para as nossas demandas, os nossos rituais, para a nossa forma de ser e estar nesses espaços. Assim, construiremos condições de participação”, destaca.
“São desafios constantes e que vamos pontuando em cada interlocução que a gente tem para se manter saudável emocionalmente. Não podemos desistir, temos que passar para as mulheres que chegam que a nossa parte da luta está sendo entregue. Eu só estou aqui, porque outras mulheres fizeram uma caminhada para podermos estar nesses espaços”, completou, emocionada, a reitora do IFNMG.
Comprometimento do Conif
Conforme mostrou uma matéria publicada pelo Conif, no dia 8 de março de 2022, a Rede Federal tem buscado ferramentas eficientes para incentivar a presença feminina nos ambientes escolares e profissionais. Segundo dados da Plataforma Nilo Peçanha, do Ministério da Educação (MEC), a quantidade de mulheres estudando na Rede Federal passou de 813 mil, em 2023 - enquanto 663.197 mil eram homens.
Nesse sentido, uma das iniciativas criadas pela Rede Federal para atender o público feminino é o Programa Mulheres Mil, desenvolvido em parceria com o governo canadense em 2005 – hoje liderado pelo MEC. O programa oferece cursos de formação inicial e continuada para mulheres em situação de vulnerabilidade em todo o país. À época, a iniciativa marcou a expansão da atenção ao feminino na Rede Federal.
Mais recente, o programa Power4Girls - Empower to Lead! tem trabalhado no empoderamento de meninas por meio de estratégias voltadas para o empreendedorismo, inovação, criatividade e liderança. O programa é liderado pelos Estados Unidos com o Instituto Gloria e apoiado pelo Conif. Essa é uma iniciativa exclusivamente focada na Rede Federal.
Carta
Na manhã desta sexta-feira (8/3), o Conif publicou uma carta na qual se compromete com participação de mulheres e meninas nos espaços da Rede Federal. "O Conif inicia, no ano de 2024, um Programa de Ações sobre Equidade de Gênero, com vistas à superação de estruturas arcaicas e misóginas e, deste modo, contribuindo para que as meninas e mulheres tenham oportunidades e um espaço seguro em qualquer em qualquer uma das 41 instituições que compõem a Rede Federal", diz um trecho do documento.
A iniciativa terá início com uma formação de reitores e reitoras sobre as questões de gênero e um seminário sobre liderança e representação feminina para as servidoras das instituições.
"O Conif encoraja as instituições associadas a envidarem esforços contínuos para a visibilidade das pautas de gênero que atravessam a Rede Federal, na certeza de que o século XXI é um espaço plural, diverso e inclusivo", finaliza.
Diretoria de Comunicação do Conif
Texto: Marina Oliveira
Fotos: Moacir Evangelista